Monday, August 22, 2016

Exclusiva: Guitarrista Jorge Shy faz balanço da carreira e dos 30 anos dos Heróis da Resistência

Por Maurício Sena

"Heróis da Resistência lança DVD comemorativo de 30 anos." Seria a manchete dos sonhos de um número enorme de fãs da banda carioca formada em 1986, composta por Leoni, Lulu Martin, Alfredo Dias Gomes e Jorge Shy, que decretou seu final de 1992, um após o lançamento disco “HEROIS 3 “ .
Os Heróis da Resistência surgiu da dissidência do Kid Abelha e os Abóboras Selvagens, quando Leoni, principal compositor da banda decidiu abandonar o bem sucedido e promissor projeto musical.
Leoni quase lançou carreira solo, mas decidiu por novo grupo, aliando-se a músicos de alto nível, e em 1986 foi lançado o disco homônimo que colocou em evidência a banda que emplacou os sucessos "Esse Outro Mundo", "Doublé de Corpo" e "Só Pro Meu Prazer", deixando um registro que primava pela sofisticação, com um naipe de músicos experimentados, com exceção de Jorge Shy, que se dedicava a estudar o quanto podia, mas logo se revelando grande instrumentista.


 Shy e a primeira formação dos Heróis, com Leoni, Alfredo Dias Gomes e Lulu Martin
Foi com este cara, super guitarrista hoje dedicado ao jazz, blues e instrumental, que bati um papo legal sobre a experiência com o universo pop rock do anos 80. Shy é um amigo, um cara gente finíssima, que falou de sua trajetória com os Heróis e que a qualquer momento chega em Conquista para apresentar seu novo trabalho. Hoje jorge shy já tem 3 discos solos gravados, com elogios da crítica internacional. Sua música instrumental segue viva e a cada dia conquistando mais e mais seguidores.

Seu mais recente trabalho é o Somebody's waiting, que foi enviado pelos Correios pelo próprio Shy, além do disco Crossing Path, de 2013. Dois excelentes trabalhos autorais e instrumentais, que mostram o resultado da maturação e a sofisticação já conhecida com os Heróis. Além disso destacam-se o trabalho com a banda H56, que entre os seus integrantes trazia o baterista Alfredo Dias Gomes, ex-Heróis e o disco Sonho de Aviador, de 2001, primeiro trabalho solo de Shy, no qual o guitarrista apresenta uma forte influencia da musica brasileira em suas composições.

Abaixo segue entrevista com o ex-guitarrista da Heróis da Resistência, paulista , que fala de família, das influências musicais, do início de carreira e primeiras bandas, da ascenção e digamos, declínio, dos Heróis, associada a episódios marcantes, "duas bombas", como relata. "A Warner havia mudado de presidente... e o novo “chefe" decide botar pra fora todas as bandas de Rock e que estavam em curva de declínio... a gravadora Rock dos anos 80 e que contava com: Barão, Ira, Heróis, Titãs era desmontada e teria início o domínio do “Axé”, lambada e o “sertaneja Brega”. O outro episódio, uma das músicas novas e inéditas e que abriria a novela da Globo foi cortada, levamos um golpe grande e trocados pelo Roupa Nova. Aquilo foi o sinal de que eu deveria navegar outros mares e que meu ciclo nos Heróis da Resistência estava no fim. Seis meses depois, o Leoni resolveu partir para carreira solo e foi o fim da banda." Sobre um possível retorno ou show comemorativo de 30 anos dos Heróis em sua formação original, Shy responde: "Infelizmente, não!".  

Maurício Sena: Vamos ao trivial: Quem e Jorge Shy?
SHY: Nasci na cidade de São Paulo e cresci em uma casa com muita música. Meu pai, Silvio Fernandes, um publicitário de Natal (RN), foi criado no Rio de Janeiro na época em que o Beco das Garrafas fervilhava e a bossa nova explodia mundo afora. Desde cedo me mostrou a obra espetacular de nomes como Tom Jobim e Elis Regina, mas também incentivava me incentivou a escutar Glenn Muller, Duke Ellington, Tommy Dorsey, os Beatles e Sinatra, entre outras influências. Fui educado num colégio que ficava em um bairro onde moravam muitos estrangeiros e descendentes de imigrantes, americanos, alemães, japoneses, e sempre tive contato com outras culturas, principalmente a que vinha dos EUA, coisa comum para quem cresceu em SP nos anos 70 e 80. A relação muito próxima com meu avô paterno, Jorge Fragoso, um executivo da indústria de alumínio, também me marcou. Em meados dos anos 30, o patriarca Jorge morou em Bremen (Noroeste da Alemanha), onde aprendeu a construir aviões. Chegou a fazer estágio na “Lufftwaffe”, principal companhia aérea germânica, mas o nazismo já dominava o país e ele teve que voltar ao Brasil, enquanto Hitler espalhava seu regime de terror pela Europa e a guerra eclodia. Meu avô me mostrou o que era música clássica. Mas foi também a pessoa que me ensinou os principais valores universais.


MS: A relação com a música começa neste ponto?
SHY: Meu pai nasceu em Natal na época em que a cidade abrigava uma base aérea dos Estados Unidos, durante a Segunda Guerra Mundial. A música e os costumes dos americanos chegavam com força naquela ponta do Brasil e ele foi muito influenciado por esse clima. Desde pequeno, me lembro dele me chamando para ouvir o ‘piston’ (trumpete) do Louis Armstrong ou um disco novo do George Harrison que acabara de sair. Foi assim que começou meu amor eterno pela música.

MS: E a relação com as guitarras, quando surgiu?
SHY: No início dos anos 80, a paixão pelos Beatles me levou às aulas de guitarra. Meu pai dizia que eu deveria aprender violão primeiro e acabei dominando os dois instrumentos ao mesmo tempo. Naquela época São Paulo tinha um cenário de música inovador, com ótimas bandas como Tutti Frutti, Terco, Rock Memory, Beatles Forever e Comitatus, que precederam a explosão do rock nacional. Dois momentos me marcaram muito: a morte de Lennon, que me fez mergulhar fundo na música,  e o primeiro show de  rock em um estádio brasileiro, do  grupo inglês Queen, em 1981. Ao ouvir aquele som ‘massivo’ saindo das enormes caixas, fiquei petrificado, encantado. Foi ali, naquele momento, que disse para mim mesmo:  É isso que eu quero fazer da vida.

MS: E como foram os primeiros passos da carreira até chegar aos Heróis?
SHY: Foram várias bandas de escola, projetos amadores e semi-profissionais até o início da carreira musical nos Heróis da Resistência. Quando cheguei ao Rio, eu era apenas um garoto de 18 para 19 anos, no meio de músicos de muita experiência e calibre internacional. Alfredo Dias Gomes tocava com Lulu Santos e já havia tocado com Hermeto Pascoal e Ivan Lins. Lulu Martin era um dos melhores pianistas da cidade e tocava na banda de jazz Garagem, com estrelas como Marcio Montarroyos, Arthur Maia, Mauro Senise, Rique Pantoja  entre outros. Além deles, Leoni, que vinha do enorme sucesso com o Kid Abelha, e já era um dos grandes ‘hitmakers’ dos anos 80, completava os Heróis. Esse processo me fez crescer muito, pois estes músicos me puxavam para cima o tempo todo. Tive momentos muito difíceis, mas eu ia dando o meu jeito.

MS: O processo de produção dos três discos, como se deu?
SHY: Na gravação do primeiro disco conheci Liminha. Ele é dono de uma personalidade muito forte. Era bravo, duro, exigente, mas também sabia ser muito gentil. Foi um dos grandes professores que tive na música. No segundo disco,  “Religio”,  a banda foi convidada por Liminha, que havia mudado para os EUA, para gravar em Los Angeles. Ele buscava bons músicos para executar, gravar e fazer experimentos em terras americanas. Os ‘heróis’ passaram quatro meses na América fazendo a pré-produção do disco, gravando e, depois, mixando nos grandes estúdios como o Ocean Way, onde Michael Jackson gravou “Thriller” . “Um dia chego de carro com o Leoni e, no estacionamento ao nosso lado, para uma Mercedes conversível e vejo saindo, nada mais nada menos,  que Mr. Burt Bacharah (pianista e compositor norte-americano).  ‘Hi Burt!’, acenamos. Lá era assim. Quando o disco ficou pronto e a banda voltou ao Brasil, a gravadora Warner soltou uma bomba, informando que o orçamento havia estourado e que não havia verba para a divulgação do álbum. Era para ser o apogeu do grupo, mas foi um revés na carreira dos Heróis da Resistência.

MS: O que aconteceu a partir daí?
SHY: Esse disco causou várias sequelas,  entre elas o afastamento de Alfredo e Lulu,  que ficaram descontentes com o rumo que as coisas tomaram naquela época . O Cadu (baterista) entrou e fez o trabalho do segundo disco,  levando ao palco outra inovação: um computador Macintosh de última geração, que controlava os teclados e ‘sequencers’ e era acionado do palco. Ali eu diria que os Heróis, mais uma vez, inovaram na música brasileira. Foram a primeira banda a gravar e mixar um disco no exterior e levar ao palco uma tecnologia ainda inexistente no país naquela época. O fato de ser um “técnico” nunca fez do Cadu um grande baterista, e este foi o principal motivo para ele deixar a banda, dando lugar ao Galli (ex - Hanoi Hanoi ), que se encaixava na nova proposta da banda de adicionar peso ao som do grupo, transformado num ‘power trio’.

MS: E o disco Herois 3, um dos melhores do rock nacional, como nasceu?
SHY: O disco ‘Heróis 3’ foi gravado no estúdio ‘Nas Nuvens’ e,  desta vez,  produzido pelos Heróis e por Ricardo Garcia, hoje um dos grandes masterizadores do Brasil. Na época ele estudava muito violão clássico e jazz, atingindo o auge da fase técnica como guitarrista de rock. Por diversas vezes fui citado pela crítica por ser um guitarrista diferenciado no rock nacional. No mesmo período, comecei a sentir vontade de estudar ainda mais, de ir para os EUA e me tornar um músico mais completo. O “Heróis 3” não foi um sucesso comercial, mas levou a banda a rodar o Brasil. No final do ciclo, quando os músicos já se preparavam para um novo trabalho, a Warner sofreu mudanças. O então presidente nacional Andre Midani foi para a Warner Internacional, em Nova York, e a nova direção decidiu dispensar todas as bandas de rock cujas vendas estavam em declínio.

MS: Então, Shy, quais foram os prejuízos, afinal?
SHY: A casa de grandes sucessos do rock nacional, como Barão Vermelho, Ira e Titãs, foi desmontada. Era o início do domínio de ritmos como axé, lambada e sertanejo. Outro duro golpe contra os Heróis foi quando uma de suas músicas inéditas, selecionada para abrir uma novela da Globo no horário nobre, acabou cortada em cima da hora. Aquilo foi o sinal de que eu deveria navegar outros mares e que meu ciclo nos Heróis da Resistência estava no fim. Seis meses depois, o Leoni resolveu partir para carreira solo e foi o fim da banda. O terceiro disco do grupo representou também o final de uma era de ouro do rock nacional. A obra foi recentemente eleita como um dos dez melhores discos de rock já produzidos no Brasil.

MS: E atualmente, como resumiria sua carreira ainda curso?
SHY: Deixei os Heróis em 1992 e no ano seguinte me para Boston, nos Estados Unidos, onde me graduei em composição na Berklee College of Music no ano de 1998. A partir daí desenvolvi um trabalho autoral calcado no jazz e na música instrumental brasileira. Lançei quatro discos: “Guitartales” e “Sonho de Aviador”, ambos de 2001, “Crossing Path”, de 2013, e o recém-lançado “Somebody’s Waiting”. Paralelamente, Shy atua como educador na Faculdade e Conservatório Souza Lima, uma das mais importantes escolas de música São Paulo.

MS: Shy, muito obrigado pelo bate papo.
SHY: Eu que agradeço a oportunidade de poder falar um pouco dos Herois , uma banda que com certeza marcou o cenário do Rock nacional e que ainda e muito curtida pelo pais afora e contar um pouco da minha carreira e vida também.  E para aqueles que tiverem interesse em acompanhar as minhas atividades, cadastre e visite o www.shymusic.com.br. Forte Abs!



 

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