Tuesday, July 31, 2018

Legião Dois, o meu predileto, e seus 32 anos



Por Maurício Sena

A sensação de ter em mãos um vinil há muito desejado é um estado de felicidade e contemplação inexplicáveis. Fui afetado por este sentimento inúmeras vezes, em especial na adolescência, não apenas pela adoração a determinados grupos, mas também devido às dificuldades para aquisição dos mesmos, adquiridos a duras penas, menos em função das economias, mais devido a presentes, vindos de longe, muito longe, como foi a chegada de As Quatro Estações, da Legião, vindo de São Paulo, presenteado pela tia Fátima, irmã caçula da minha mãe.

Tive estas mesmas sensações ao me deparar como outros tantos vinis, cds e até fitas, que de tão queridas e valorosas, passavam por cirurgias contínuas para se manterem vivas e audíveis. Naquele tempo era difícil chegar a número considerado de peças e o acesso era terrivelmente complicado, sobretudo no interior. Mas ainda foi possível reunir muito dos Beatles, Legião, Titãs, Ultraje, Dire Straits, Nenhum de Nós, Biquíni, Paralamas, Ira!, estas bandas nacionais pelas quais tínhamos verdadeira adoração, claro que com especial olha para Legião Urbana. Legião era Legião.


Aos 12 anos, a primeira música que tentei debulhar no violão foi Índios, ali por volta de 1986. Eu não tinha ideia do que se tratava, não sabia a mensagem, como era o disco e muito menos a cara dos indivíduos que formavam a banda, da qual eu só sabia o nome. Passados longos anos, esse não sei como chegou a mim, tive acesso ao Legião Dois, disco cuja estética crua, direta, lúcida, equilibrada me emocionava, da capa ao encarte, nas disposição das letras das músicas, e nas viradas do lado A e lado B do bolachão que não sei contar quantas vezes virei entre um lado e outro.

O "Dois" chegou aos 32 anos de existência e é sem dúvida o melhor da Legião, ao menos para mim, e é o melhor de todos que já degustei, com certeza, não vou achar unanimidade nesta opinião. Mas são muitos as coisas que me inclinam a gostam tanto do disco, que vai das músicas, às linhas de baixo, poesia e também à existência de Renato Rocha na banda, único negro de destaque entre bandas nacionais que atingiram o topo, história trágica que não precisamos recontar aqui, mas que a mim atingiu mais diretamente.

O fato que é que além de índios, lá estão Ainda é cedo, Quase sem querer, Eduardo e Mônica, Tempo Perdido, e a minha predileta, Acrilic On Canvas, músicas eternas, um legado musical do rock nacional, que traz ainda aquelas cujo nome me deixavam confuso, como Plantas Embaixo do Aquário e a simplória e marcante Central do Brasil, registro instrumental com assinatura inquestionável da Legião Urbana.

Eu e Fábio, meu irmão caçula, arrancamos toda a sonoridade possível daquele disco, que me atentou para muita coisa, como a exigência de sempre ouvir aquilo que se julga bom para ouvir, com a poesia pulsante de Renato Russo, obra que fizemos questão de passar adiante, e 32 anos passados, nossos filhos e sobrinhos o degustam com sabor semelhante, perdendo apenas no tempo e no espaço o sabor daqueles momentos. 

No comments: