Esse é, talvez, para quem julga que não vivo dias de interesses comuns (como já declararam), daqueles de cada um.
Ou para os que afirmam que invento uma coisa que se dá como real, tal qual Naomi ou Ely no final do filme bobo de amor.
Entre as histórias, os tratados e encontros que conto aqui (como também já divulgaram), meu dia, do nascer ao pôr do sol, é absolutamente regulamentar, fluxo e refluxo do mar.
Primeiro, não sei mais passar a vida (e o vento no rosto) de bicicleta.
Tenho, restritamente, uma manhã desaparecida, pé ante pé, no tempo (meu próprio tempo), na ordem e no lugar.
Sou o cara por trás do rosto barbado, uma fase, um sonho engaiolado que continua a rebobinar.
Quero ser valente, mas o que sou é todo mundo (e ninguém), profundo, sem nenhum fundo de garantia.
A crise (quase que efetivamente física) de não conseguir despertar, vai mais longe do que eu pensaria raiar.
Não tomei aulas de direção, mas sei (aprendi) caminhar.
Não falo outra língua, mas chego a cogitar, entre um sonho e meio, que, se não irei desempenhar um esforço (por receio), daqueles de sol a sol, pelo menos darei ordem ao tumulto do coração (versus razão).
Segundo assim, eu marco, com meu próprio nome, que um quarto desorganizado vai do templo interior ao pendor da solidão.
Vai de Nova York a Londres ou Paris, das trilhas de Minas a Catmandu (que nunca fiz).
O máximo do adormecimento que registrei é o acalento de um sonho com minha mãe.
Minha mãe sabe que eu choro.
Ela quem me levou para um canto e disse assim, terminante: "Você precisa, de agora em diante, cuidar da respiração".
Entre projetos intermináveis (que pouco resta a intenção de fazer), planos emperrados, palavras em revisão, um livro que já passa do prazo de publicação e a anatomia incompleta do coração, algumas coisas resistem (o dia, posso dizer).
Sento, almoço, pondero, deliro na caligrafia (não sei mais escrever à mão).
Sento outra vez, agora com o pequeno grande Ícaro, para falar de poesia ou traçar uma recuperação (em Gramática, claro).
Faço uma audição desatenta de Gainsbourg e canto baixinho a chanson.
Se bem conheço as reações do meu corpo (e só eu mesmo posso permanentemente fazê-lo), devo estar, de repente, entre a brisa e a umidade (já que, ao mesmo tempo, chuva não posso ser).
Devo apanhar uma tempestade no caminho, estancar embaixo de uma marquise, não olhar o espelho e (dizer que) foi tudo refletido em vão.
No entanto, duas boas circunstâncias eu descrevo: um bardo passou por mim a passos ligeiros e voltei a encontrar Luí (ah, as esquinas dobradas da vida).
Deixaram um exemplar de uma revista sobre a mesa. O título: "Como domar a sua mente, agora" (pra mim?).
Passei um traço marcador em linhas dignas de nota (da vertigem da linguagem à derrota).
Numa delas, um escrito sobre os esquecimentos, os enganos dos sentidos e outros lamentos coletivos.
Os vinhos baratos que comprei, o corpo fora de forma e todo o meu bairro bem sabe que não tenho um amor.
Noutra, o trecho de alguma coisa que Ferreira Gullar ditou (questão de vida ou morte).
Para quem julgar (ser) estranho que eu encare minha mortalidade, até que aprendo alguma verdade (lições).
Meu jeito de ver as coisas (vai) além das necessidades e das canções.
Minha habilidade em (bem viver ou tão somente descrever) dias santos, além de outros tantos.
Minha recompensa (acolá) da paciência em viver alugando a casa do coração.
Entrem, pois, parênteses, pela porta lateral (depois do vão, do vazio).
E, aqui ditos, meus dias seguem tardios, (nos sinais de pontuação), escritos à parte.
Será (arte)?
Marco Antonio Jardim Melo
(inspirado no livreto do jovem escritor Gabriel Tupy e na obra do velho escritor Ferreira Gullar)
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