Por Milton Filho
Uma parede pode ser branca da cor da nuvem mais branca mas, se eu berrar, espumando pela boca, acintosamente, querendo convencer sobre esse magnífico detalhe, sua brancura, por mais óbvio que seja, o foco irá se descolar dessa realidade, despencando para o melindre mais constrangedor do total desacordo.
Formar tribos fechadas, onde todos pensam iguais, não é só patológico, é perigosamente contraproducente, inviável e impossível se há um querer honesto em direção a uma evolução saudável e criativa. Ninguém é igual a ninguém, nem na maioria dos detalhes, nem mesmo na forma de sentar e cruzar as pernas. A tribo é planetária e disso não há como fugir. Até tentamos tatuar símbolos nas coxas mas, ninguém escapa das latrinas e seus desarranjos intestinais pútridos. Somos essa promessa firmada ao nascer dessa roupa biológica e frágil, ficará só o cabide de ossos que, alguns até transformam em cinzas e, este é o fim até mesmo das pedras.
A nação dispersada, agora dividida ao meio, briga por migalhas, inflada de atributos os mais constrangedores. Bem, pelo menos, agora, há dois blocos, porque antes não havia nada. Estamos nos aproximando, enfim, de uma unidade, embora isso pareça ser uma ironia e, talvez até seja mesmo e eu não a identifiquei na minha pobre e medíocre subjetividade.
O momento é grave mas, o mais oportuno de todos e, digo porquê.
Em que outro momento da história tivemos tanta informação online? Em que outro momento da história pudemos nos informar tão rapidamente? Em que outro momento da história tivemos à mão tal tecnologia que possibilitasse o diálogo franco, a possibilidade de uma boa fundamentação de ideias, mostrar as vísceras e, educadamente, convidar o outro para ressignificar suas interpretações equivocadas ou, melhor, perceber o próprio erro e salvar-se do afogamento? Tudo isso, ali mesmo, no ponto de ônibus, e, justamente quando você ia cometer aquele erro fatal, dizer exatamente o contrário do que de fato as coisas são e que te salvou de pagar o mico da história. Você esclareceu ou foi esclarecido e uma vida foi salva, quem sabe muitas outras, já que somos, agora, uma rede (sempre fomos uma rede), e, nem pense em cortar os fios, é impossível, a trama foi urdida na invisibilidade cósmica, é a prova de sabotagem.
A mídia não nos dividiu, tirou nossas máscaras e mostrou aquelas tendências íntimas, nossa boa educação, mostrou a ferro e a fogo ardente, de uma forma magistral, como somos tolos e de fácil manejo.
Não há, não existe, nunca existiu e não haverá outra forma para equacionar o problema, senão através do DIÁLOGO. Fora disso, você até pode construir um castelo mas, não irá durar muito tempo sem cair, afinal, a base será de areia, totalmente insegura, construída, concretizada em material inadequado, qual seja, o medo, a ilusão, a mentira, o constrangimento, enfim, a ignorância.
Hoje, posso abordar qualquer pessoa do globo terrestre e dizer o que penso, posso tirar uma foto honesta e mostrar a realidade de um fato. Posso, inclusive, mandar um corrupto pra cadeia, usando um celular. Posso fazer pressão no sentido de construir um lugar melhor, se não for para mim, que seja para os filhos e para os netos.
As poucas ou muitas vezes em que berrei, querendo provar que a parede é branca, logo após, senti vergonha de mim mesmo, porque perdi a oportunidade de ser humano, verdadeiramente humano, aquele que salva seu irmão de uma possível queda. Caímos os dois mas, eu, caí duas vezes, afinal, perdi uma oportunidade brilhante em todos os sentidos, sejam eles quais forem.
Branco, preto, moreno, albino, religioso, ateu, santo, pecador, esquerda, direita, centro, alto e baixo, homossexual, heterossexual, bi, trans, homens e mulheres de todos os matizes... dialoguem. Não há outra saída, não há magia, milagre, só o conhecimento e o amor e, isto, só se constrói nas relações, respeitando e entendendo alteridades, diferenças, inclusive necessárias, vitais à evolução do homem.
Quando você bloqueia a outra “tribo”, não se engane, você está bloqueando a si mesmo e construindo uma ilha. Só caberá você e toda a sua infelicidade solitária.
1 comment:
Esplêndido.
Post a Comment